Relato Eva - Nascimento da Júlia

Eva – Anápolis/ Goiás
RELATO DO NASCIMENTO DA JÚLIA – PARTO NORMAL APÓS CESÁREA




Hoje Júlia virou de bruços sozinha! Enquanto eu acompanhava sua descoberta em virar de bruços é que percebi o quanto o tempo passou rápido nestes quatro meses e cinco dias, cento e vinte e cinco dias desde o seu nascimento e vi que já era hora de sentar e redigir o relato do seu nascimento.
Entretanto é impossível falar do parto da minha filha Júlia desconsiderando as minhas outras gestações porque uma história está ligada a outra e todas
fazem parte do ser humano que sou hoje. Assim sendo o relato do parto da Júlia é na verdade um memorial da minha pequena experiência com a
maternidade.
Em janeiro de 2006, sem nunca tomar anticoncepcional neste intervalo, eu descobri que estava grávida e foi o período mais feliz da minha vida: sonhos, enxoval, certeza inocente de que nada dá errado na vida, busca por um parto normal e muito entusiasmo. A bolsa desta gestação rompeu com 29 semanas e infelizmente perdi este bebê que se chamava Rafael em um parto estúpido, violento que aconteceu 4 dias após a rotura das membranas. Tenho certeza que não perdi este bebê como consequência do parto, não foi o parto que o matou, mas talvez a imensa quantidade de intervenções utilizadas no processo.
Após este parto fiquei realmente muito traumatizada, assumi toda a culpa pela perda do bebê, me sentia desnorteada e sem coragem de engravidar
novamente. Fiquei doente de verdade, medo de hospital, de médico, de gravidez, de quase tudo, quase parei de trabalhar, não consegui terminar meu
trabalho de conclusão e perdi o mestrado que estava fazendo... em suma, me sentia um fracasso.
Em Agosto de 2008 descobri que estava grávida e começou então a busca por um nascimento que NÃO lembrasse a experiência anterior. Resolvi ter meu bebê em um hospital de referencia em parto normal da cidade de Ceres, a 150km da minha cidade, mas em nenhum momento eu me preparei para que este nascimento fosse uma cesariana. Mais uma vez a bolsa rompeu sem trabalho de parto algum e fui para o hospital onde induziram o parto através de prostaglandinas mas ao final de 24h de bolsa rota sem tp espontâneo o obstetra indicou a cesariana e eu segui pro centro cirúrgico muito a contragosto, me sentindo literalmente um animal indo pro abate e assim Fernando nasceu sem que eu o visse na hora do nascimento.
A experiência da cesariana foi devastadora pra mim. Achei tudo ruim, o antes, o durante (é horrível ficar amarrada e inerte esperando ser cortada)
e o depois foi caótico porque se com o bebê natimorto eu havia ficado doente com a cesariana eu dava mostras de ter perdido boa parte da sanidade.
O que me doía muito era ver que para a maioria das mulheres com quem eu conversava a experiência de ter um filho por meio cirúrgico não havia lhes
causado tanto dano! Me sentia um fracasso : ” todo mundo hoje em dia passa por cesariana, por que eu tenho que ficar doente deste jeito?” – era o que
pensava.
Eu fiquei amarga e ressentida, achava que havia sido punida com algum tipo de castigo, eu era incapaz de parir um filho. Mas o pior de tudo era o medo e as sensações de reviver a hora da cirurgia, passei a sentir tanto medo que não conseguia nem assistir a uma cena de cirurgia em TV, filme, nada, tinha que mudar de canal, virar o rosto pq começava a me sentir muito mal. Sentia a cabeça arder, passei a esquecer as coisas, quase perdi o emprego, comecei a errar no trabalho, perder prova de aluno, sentia várias vezes ao dia o cheiro do hospital, a sensação da criança sendo arrancada e não conseguia ter alegria pra brincar com meu lindo bebê Fernando.
Tudo isso me levou a decidir nunca mais engravidar porque a simples ideia da possibilidade de viver outra cirurgia e outra dolorosa e lenta recuperação eram insuportável pra mim, mas como eu estava muito mal, esquecida e confusa eu me esquecia de tomar o anticoncepcional, coisa que durante anos nunca havia tomado e como consequência não tive ciclo menstrual em dezembro de 2009, o que me deixou VERDADEIRAMENTE desesperada.
Em dezembro de 2009 fiz um teste de farmácia e confirmei o que já sabia: estava grávida novamente. Grávida, doente e com um bebê de oito meses! Foi demais pra mim, chorei copiosamente todos os dias durante pelo menos duas semanas. Meu marido me encontrava chorando pelos cômodos da casa, falando sozinha e chorando, chorando, chorando. Olhava pro Fernando e desabava a chorar pensando: eu não consigo passar por tudo aquilo de novo, eu vou morrer.
Comecei o pré-natal com uma medica daqui que disse não recomendar parto normal pela proximidade da cesariana e o risco de ruptura uterina e procurei uma nutricionista porque eu estava muito, muito gorda mesmo, aproximadamente 88 kilos.
Quando a minha bebê completou 12 semanas de gestação fiz a primeira usg e quando vi seus bracinhos, suas perninhas mexendo, sua cabecinha
virando...senti aquecer uma ternura tão boa dentro de mim que imaginei que talvez aquilo tudo pudesse se transformar em algo muito bom. Foi quando
contei para minha família que estava grávida, procurei uma nutricionista pra controlar o peso e comecei a buscar ajuda na internet tendo duas coisas em mente: 1) tentar um parto normal – 2) me preparar pra não sucumbir a uma nova cesariana.
Neste período tive uma seria conversa com meu marido e disse que iria fazer meu pré natal em Goiânia porque aqui em Anápolis não acharia nem quem me deixasse TENTAR o parto e eu queria pelo menos TENTAR porque se eu fosse pra uma cesariana com hora marcada, sem nem entrar em tp com certeza eu iria ficar doida de vez e propus ir a Goiânia de ônibus e pagar um taxi pra me levar na hora do BB nascer, mas que eu precisava ir. Diante da minha convicção ele cedeu e como não sabia dirigir em Goiânia imprimiu mapas do Google maps pra aprender a chegar ao consultório medico.
Minha amiga Michelle Guirado havia tido um bebê em Janeiro em um parto normal muito respeitoso com Dr. Julio Porto e sido acompanhada por sua esposa, Karen Leverger, que é obstetriz e com quem eu já trocava e-mails desde a gravidez de Rafael e isso tudo me fez marcar uma consulta. (Quando eu havia estado grávida do Fernando quis ir fazer o pré-natal com ele mas acabei indo pro hospital Pio X de Ceres.)
Na consulta fui recebida por um médico bem humorado, que ouvia e eu perguntei se ele aceitava me deixar tentar um parto normal e quando ouvi que SIM senti meus olhos marejarem! Aí desaguei falar: se a bolsa romper, podemos esperar mais de 24h? Posso ter meu marido comigo? Bla, bla,bla, bla.
Bem, toda mulher sabe o quanto uma gravidez passa rápido! Quase não dá tempo de fazer nada e já estamos no nono mês. Foi assim comigo também, os meses voaram e o do pré natal quero ressaltar o acordo que eu fiz com o medico que
ele só me indicaria uma cesariana se houvesse risco pra nenê, fora isso não, e se eu não aguentasse a dor e pedisse uma cesariana ele falaria que NÃO. Este foi nosso acordo. Por fim cheguei às 38 semanas pesando 91,5 kg, havia emagrecido 3 kilos nos 4 primeiros meses da gravidez e engordado por volta de 4 quilos apenas do meu peso inicial.
Sentia-me muito tranqüila com Dr. Júlio, a cada consulta eu ia delineando como gostaria que fosse o parto e como gostaria de ser tratada caso fosse uma cesariana e ia administrando meu medo. Eu trocava email com sua esposa Karen e com várias pessoas ma-ra-vi-lho-sas que me carregaram no colo nesta gestação como Denise Ahrends, Rebeca, Michelle e as mulheres das listas Parto Nosso e Ciranda de Mulheres. Acertei com o médico até a forma de pagar já que ele não atendia pelo meu convenio e eu fui sincera, pedi pra parcelar e ele parcelou numa boa e me cobrou pela tabela do meu convenio que é mais em conta que a tabela da UNIMED que ele atende.
Júlia era esperada pro fim de julho/2010,eu havia combinado com Denise (Ahrends) que ela viria do Rio ficar comigo a partir do dia 30/07 já que a dpp podia ir ate dia 10/08, 42 semanas mas mal imaginávamos a surpresa que essa menina sapeca nos faria! Dia 02/07 fiz a ultima usg e ela estava encaixada, quietinha, cefálica e era só esperar...
Bem, na manha de sábado do dia 17 de julho quando eu abri os olhos e fui virar na cama senti o dilúvio escorrendo nas minhas pernas, ou seja, a bolsa havia rompido! Levantei e fui tomar banho sem chamar ninguém mas logo meu marido chegou atrás e eu disse que havia chegado o dia. Por dentro senti muito medo pois do Rafael a bolsa rompeu e levei 3 dias pra entrar em tp e do Fernando a bolsa rompeu e em 24h não tive uma contração espontânea. Sentia que eu havia entrado num torvelinho, agora não tinha mais jeito, era ir pra frente.
Após o banho, já usando fraldão (de verdade) eu liguei pro médico e tenho certeza que o acordei. Contei que a bolsa havia rompido e ele disse pra ficar calma, perguntou a cor e o cheiro do liquido e disse que eu ficasse calma, desse uma volta dentro de casa e tornasse a ligar em 4h pq ele não queria me internar muito cedo. Eram 7h30min da manhã quando desliguei o telefone e fui tomar café.
Saímos, fomos ao caixa eletrônico pegar dinheiro, fui andando devagarzinho e quando voltei e fui trocar a super fralda vi que agora o liquido estava esverdeado, meio verde e gelei de medo, pensei: ”mecônio, que droga, agora lascou tudo”. Fiquei no banheiro pensando: “ posso não falar nada do mecônio e esperar o tp...mas e se não falar e isso causar algo e eu perder a bebê pq fiquei calada? E agora?” Nisso comecei a ter leves contrações e liguei pra Karen, avisei das contrações, liguei pra Michele, disse que ia precisar da banheira emprestada e liguei pra Denise falando que não ia dar tempo dela chegar e contei apenas pra ela do mecônio e disse pra ela torcer pq eu não sabia o que fazer.

As contrações ficaram regulares e eu fiquei sentada quietinha no meu quarto queimando a cabeça pensando se contava ou não do mecônio. Nisso já eram umas 10h30 quando meu marido veio falar comigo alguma coisa e ele percebeu que no
meio da sua fala eu tive duas contrações com intervalo de cinco minutos entre uma e a outra e ele me deu um ultimato: não vamos esperar mais, vamos pro hospital agora! Pegamos bolsas, malas, esquecemos a câmera fotográfica e
eu nem pude tomar o prato de sopa que minha sogra (ela estava lá em casa) fez pra mim, foi dar um beijo nos que ficam, abraçar o Fernando e sair rumo a Goiânia.
Na estrada as contrações ficaram muito, muito fortes mesmo e eu me agarrava na porta do carro me retorcendo a cada contração mas não falava nada, tinha medo de atrapalhar o motorista, mordia a boca e ficava calada. A cada contração eu expirava, fechava os olhos e pensava que era uma a menos, menos uma, menos uma.
Internei ao meio dia na Maternidade Modelo e fui direto pra debaixo do chuveiro, eu coloquei um sunquíni e fiquei lá acocorada com a água caindo no quadril e pensando no mecônio que agora estava bem mais grosso e manchava a
fralda q eu havia tirado. Eu estava assim quando Michelle chegou e entrou no banheiro, foi quando eu disse: “Amiga, no que a gente se mete!” - ao que ela respondeu: “Não amiga, é por que é que a gente mete?!” o que me fez dar uma gargalhada mesmo com as contrações me moendo. Aí eu contei pra ela do mecônio e comecei a querer chorar, ela disse pra ficar calma, que o medico já vinha e a cada contração ela me dizia: “menos uma” e eu dizia “antes isso” pensando na cesariana.
Quero deixar claro aqui que parto dói, não vou dourar a pílula, dói e dói mesmo mas afirmo que antes aquela dor toda e toda aquela sensação de “não agüento mais” “não vou dar conta” do que uma cesariana. Por que a gente ACHA que não dá conta mas na verdade a gente consegue sim e nosso corpo é preparado pra cada uma das contrações.
Nisso chegou Karen, toda bonita, com uma blusa azul e pediu pra fazer o exame de toque. Ao fazer o exame foi o choque, ela disse que a Júlia estava pélvica, ou seja, sentadinha e daí em diante eu fui ficando nervosa, perdendo o controle e confesso, fui realmente me enchendo de medo porque o meu bebê Rafael que nasceu sem vida também estava sentadinho.
Algo que me deixou muito decepcionada foi a forma como eu agi, porque eu imaginava que eu seria uma parturiente controlada, respirando, seguindo as contrações e na verdade eu fiquei muito a mercê da dor, fiquei muito nervosa, perdi o controle e comecei a gritar quando as contrações vinham, enfim, em nada eu me parecia com os vídeos de “home birth” ou “orgasmic birth” que havia assistido. Quando vinha uma contração eu gritava : “Jesus me ajuda”, gritava o nome do meu marido, que sempre estava ali do meu lado e torcia a camisa do pobre nas mãos até quase rasgar tudo...a sensação que eu tinha era mesmo de que não ia conseguir, que era demais pra mim e que a dor aumentava a cada contração e ainda mais sabendo da posição da Júlia aí é que eu “desci a ladeira” mesmo. 
Nisso a piscina inflável da Michelle encheu e eu entrei dentro e a maravilhosa Michelle ficou jogando a água nas minhas costas (compramos 7 metros de mangueirinha de chuveiro pra a água ir do banheiro pra parte do quarto onde cabia a piscina) e eu perguntei pra Karen como seria já que ela estava sentada no que ela respondeu que o Júlio já vinha e ele iria me examinar, mas eu comecei a chorar, me lamentar e a dizer: “Ai meu Deus, tudo em vão, chegar até aqui e ir pra faca” “ô Julinha, pq vc virou?” e os pedacinhos de mecônio iam se misturando à água, parecendo lodo flutuando e
eu pensava no mecônio, pensava na posição da Júlia e pensava que não ia agüentar, pensava em pedir uma cesariana logo já que não ia ter jeito mesmo, pensava em esperar só mais uma contração, pensava que ela ia nascer morta como o Rafael, pensava em esperar só mais uma contração, só mais essa, só mais essa...
Quando o médico chegou me olhou com a carinha tão boa, disse que ia examinar e eu só consegui falar que não agüentava mais. Ele fez o toque, fez uma cara que eu não gostei de jeito nenhum, fez outro toque e falou: Você 
está com 4cm, a Júlia está sentada mas ela desceu um pezinho, não está pélvica completa, o pezinho está na frente, pra baixo do bumbum, o que dificulta muito. Ai, que desespero, aí comeceia falar um monte de bobagem, a dizer que não adiantava mais nada mesmo, que a gente já podia ir procentro cirúrgico, afinal de contas não ia ter jeito e ele pediu pra esperar pelo menos mais meia hora e me pediu pra ficar de cócoras, eu obedeci mas me sentia muito desolada, absolutamente desolada.
Eu gritava “gente, me ajuda!”, olhava na cara do médico todo pensativo e gritava “Júlio, me ajuda!” e numa dessas ele perguntou que ajuda eu queria, se eu queria uma cesariana ou se eu queria uma analgesia e eu lembrei o que é uma cesariana e pedi uma analgesia. Eu pensava mesmo que se a dor estava daquele jeito com 4 cm eu ia morrer quando chegasse aos 10 cm.
Numa hora que eu fiquei de cabeça baixa na banheira ouvi uma das duas (Karen ou Michelle) perguntar pro médico: “Mas a nenê não pode subir o pezinho e ficar em posição pélvica completa?” ao que ele respondeu: “Pode, pode tudo, mas eu nunca ví” e senti que era o fim mesmo, que ia pra faca. O meu marido ficava agachado do lado de fora da banheira e qd vinha acontração eu enfiava o rosto na camisa dele, quase rasgava tudo e ficava gritando “Weliton, Weliton!” como se ele respondendo diminuísse o medo e a dor.
Num relance eu vi que a Karen estava rezando, vi os seus lábios sussurrando alguma coisa e pensei: “quando a enfermeira começa a rezar é pq a coisa tá feia” e fui sentindo a dor cada vez maior e eu cada vez menor...eu pedia a Karen pra me ajudar a respirar e ela foi fantástica, foi fantástica mesmo! Aliás não sei como seria sem estas duas mulheres maravilhosas que ficaram ali e em nenhum momento me falaram que não tinha mais jeito.
Quando tinha mais ou menos uma hora que o médico havia chegado no quarto ele pediu pra fazer novo toque e pediu a Karen pra falar pro anestesista esperar mais um pouco (depois eu soube que já havia médico até se prontificando pra auxiliar na cesariana) e ao fazer o toque me falou com a cara mais boa do mundo, “Você dilatou tudo, 10cm e a Júlia desceu a bundinha, subiu o pezinho e está com a bundinha aqui em baixo, podemos ter um parto normal”. Fomos de 4cm pra 10cm em uns 40, 50 minutos!
Então eu disse que não aguentava mais e perguntei se podia ter algo pra ajudar com a dor e então ele me disse que sim, mas não no quarto e sim no centro cirúrgico, e se fosse pro centro cirúrgico só sairia depois da nenê nascer, ficaria lá o  expulsivo todo. Mas eu tava tão descontrolada que não pensei que pudesse ser capaz de suportar e ter a bebê no quarto, só pensava em algo pra aliviar a dor e pedi pra ficar de pé e ir pro CC. Quando saí da banheira veio uma contração tão forte que perdi as forças das pernas e a Karen me segurou me abraçando senão eu caia no chão e eu falei: “Meu Deus,
Karen, o que é isso?” e ela respondeu: “Você esta parindo, é assim mesmo, é a hora da loba”.
Não consegui andar mais, não conseguia mudar a perna porque as contrações não tinham inicio e fim, era tudo uma coisa só e por isso fui de cadeira de rodas pro CC. Lá encontrei um anestesista que nunca soube o nome mas muito educado que disse que não poderia dar uma analgesia muito forte por causa da posição da bebê mas que daria um alívio. Hoje olhando pra traz eu vejo que consegui me controlar pra tomar analgesia eu conseguiria me controlar pra ter a bebê no quarto mas na hora eu estava absolutamente descontrolada.
Então, eu que esperava um efeito que tirasse toda a dor fiquei brava com o anestesista porque a dor não havia passado (que vergonha!) e a Karen me disse: Eva, o que você quer? Um parto sem dor alguma? É apenas uma ajuda pra você se controlar melhor. E confesso que na hora senti vergonha e decidi parar de reclamar a fazer o que era necessário pra Júlia nascer. Meu marido estava na cabeceira da mesa, o anestesista a esquerda, segurando minha mão, Karen segurava minha perna flexionada e o medico estava lá pedindo pra eu fazer força e eu pensei: Como que é isso? Ouvi a Karen
dizendo pra por o queixo no peito e fazer uma força comprida e obedeci...entao o medico disse pra descansar, pra só fazer força na contração, pra não fazer força desnecessária e ao chegar outra contração eu fechei os olhos e  “hummmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmmm” força comprida que deve ter dado certo pois ganhei um ”parabéns, muito bem Eva” da equipe. Entao eu disse que aquilo não ia terminar quando o medico disse que a Júlia estava metade de fora, que era só mais uma força e perguntou se eu queria por a mão e eu não quis...mas meu marido foi ver e disse que era verdade. Então próxima contração, força, força, vi que o médico fez umas manobras e que a Karen estava ajudando e então ouvi um “uén, uén” e joguei a cabeça pra traz!
Júlio falou que ela veio com duas circulares de cordão e um nó verdadeiro no cordão e perguntou ao Weliton se ele queria cortar o cordão e ele foi todo faceiro cortar o cordão umbilical e ouvi o medico brincando que o próximo queria um parto mais tranqüilo sem tantas surpresas! Karen tirou umas fotos com o seu celular porque havíamos esquecido a câmera e senti um clima de alivio e felicidade no ar. A carinha de todos ali transbordava alegria.
Então a pediatra pegou e encostou aquela cabecinha vermelha e sujinha em mim e eu beijei e ouvi o resmungadinho mais bonitinho do mundo...ela disse que ia ter que levar pra aspirar pq ela havia aspirado um pouco de mecônio e eu
ainda pedi pra deixá-la em cima de mim porque estava apaixonada por aquela carinha inchada tão linda e dei mais um beijinho antes que ela fosse levada.
Aí foi a hora da placenta sair, eu fiquei meio tensa, lembrei do parto do Rafael, pedi pra não tracionar a placenta ao que ouvi o Júlio dizer: “claro que não, Eva” como se eu tivesse pedido a coisa mais boba do mundo e ele me disse que havia tido uma laceração onde eu levaria DOIS pontos ao que eu respondi que pra quem havia levado tanto ponto antes aquilo era nada!
Eu estava radiante, cansada, exausta e extremamente feliz. Então o médico chegou perto de mim, disse que eu seria levada pro quarto, a Karen perguntou se podia dar a noticia na lista Parto Nosso, eu disse que sim e então fui levada pro quarto com a recomendação de ficar deitada porque havia perdido muito sangue.
Dormi como uma pedra por duas horas, cansadíssima e acordei roendo de fome. Acordei, pedi algo pra comer e Weliton me deu um Toddynho q eu tomei quase em um gole só, sentia uma fome medonha e estava encantada com o fato de poder
me virar na cama SEM SENTIR DOR ALGUMA. Logo veio uma enfermeira pra me ajudar com o banho, disse que havia a recomendação de tomar banho sentada e me ajudou a levantar e ir ao banheiro e eu ficava o tempo todo pasma
observando QUE NÃO HAVIA DOR , QUE EU CONSEGUIA ME VIRAR, ME MEXER SEM DOR ALGUMA!
Logo após o meu banho a Júlia chegou! A pediatra havia recomendado que ela ficasse em observação por seis horas, até as 9h da noite mas as 6h da tarde, como ela estava ótima trouxeram a minha nenê pra mim e eu fiquei maravilhada em poder segura-la sem dor alguma, sem estar entorpecida, sem efeito de sedação, era eu, inteira, completa, alerta, acordada segurando a minha filha e conversando com ela. Pude pegá-la, oferecer o peito que ela pegou e ficou lá sugando devagarinho e eu namorando cada pedacinho dela. As enfermeiras do berçário disseram que ela era uma menininha muito valente por ter nascido daquela forma e eu me senti orgulhosa daquilo tudo.
Júlia nasceu as 3h da tarde, por volta de 7h Michelle veio me ver com seu filho Vítor e estávamos as duas eufóricas por tudo! Michelle trouxe uma manta pra eu embrulhar a Júlia e uns presentinhos e ficou comigo um pouco, nossa, enquanto eu viver serei grata a ela! As 8h da noite recebemos visita do Padrinho do meu esposo e todos ficaram pasmos em me ver sentada no sofá do quarto com Júlia no colo, eu de pernas cruzadas, absolutamente recuperada e ainda com um sorriso de orelha a orelha!
No dia seguinte Júlio e Karen vieram me dar alta e trouxeram suas duas meninas de 8 e 6 anos, uma a cara da mãe e a outra a cara do pai. Quando Karem me viu, me deu um abraço e falou como um parto era outra coisa porque eu já estava até de batom vermelho e rímel! Dr. Júlio perguntou se eu lembrava que ele havia dito que todo bebê pélvico faz mecônio pq tem a barriguinha apertada e eu disse que não, e ele me deu parabéns e alta. Recebi alta, abracei este casal maravilhoso a quem devoto toda gratidão e saí do hospital 18h após o parto andando normalmente, de óculos escuro,
batom, toda arrumada e segurando minha querida Júlia no colo.
Na saída uma recepcionista brincou comigo: até o próximo! E eu respondi: Por que não?
Terminando tudo, estou aqui sorrindo e chorando ao lembrar todas estas coisas e faria tudo de novo. Ir pra outra cidade, pagar parcelado, contar as moedinhas das economias pra pagar hospital ( deixamos ate de comprar todas as coisas da Júlia e usamos nela todo o enxoval azul do Fernando pra pagarmos o parto) e principalmente enfrentar o risco de um parto após uma cesariana, faria tudo de novo porque o parto me fez só bem. São quatro meses como uma mãe normal, sem depressão, sem stress pós traumático, brincando e cuidando dos meus dois filhotes. Aquele momento de sentir algo se abrindo dentro de você e a criança saindo não tem preço que pague, não tem sacrifício que não valha, tudo o que for preciso fazer pra alcançar um parto, vale a pena.
Hoje fico cansada, nervosa, Fernando está sapeca, ele sobe no carrinho da Júlia, etc, etc, etc, mas não sou uma mulher DOENTE. Hoje eu mesma me pego dando gargalhada cuidando dos dois, me pego falando tatibitate com a Júlia e
vivendo coisas que eu não vivi antes! E o mais incrível de tudo, que pra mim é a prova cabal de que todo sacrifício pra ter um parto digno e respeitoso vale a pena é que eu hoje penso em ter mais um filho, penso em ter mais um parto porque o pavor se foi.
Que bom seria que partos respeitosos e humanizados não fossem minoria e que os partos hospitalares não fossem uma sucessão de intervenções e de violência contra a parturiente. Toda mulher deve ser uma ativista em favor da humanização do nascimento para que parturientes sejam tratadas com respeito e dignidade em uma hora tão especial de suas vidas independente da sua classe social ou do hospital onde estão indo ganhar seu bebê. Mulheres devem ser respeitadas em seus partos, mulheres devem ser respeitadas na hora de suas cesarianas necessárias e que cada um de nós seja um disseminador da cultura de que parto normal é algo natural e de que o nascimento deve ser um momento de respeito e carinho.
Infelizmente em nosso país um parto respeitoso é quase tão difícil quanto uma medalha olímpica e eu sou eternamente grata aos que me ampararam e me ajudaram nessa travessia:
- Meu marido Weliton, que não achou que eu estava delirando e foi comigo até o fim sem pedir o médico pra fazer uma intervenção, obrigada pra sempre.
- Michelle, que me apoiou com amor e coragem em todo o tempo sem nunca desanimar e dizer que não era possível, reverencias sem fim!
- Karen Leverger que me apoiou com emails, carinho e suporte físico e emocional durante a gestação e o trabalho de parto, beijos nas mãos e nos pés sempre.
- Denise Ahrends que esteve comigo toda a gestação e se dispôs a viajar mais de mil km pra estar comigo quando a hora chegasse sempre acreditando que seria possível, minha eterna amizade e gratidão. 
- Dr. Júlio Porto que aceitou me acompanhar e tentar um parto normal 16 meses após uma cesariana e em nenhum momento fugiu do nosso plano de parto de só indicar a cesariana se houvesse risco de vida para a bebezinha, mesmo
quando a encontrou em posição pélvica. Acredito que com outro médico teríamos outro final. Salve, salve, salve!
A todos os que acreditaram, que me ajudaram quando perdi meu primeiro filho, que me explicaram o que era stress pos traumático quando tive o Fernando, que me apoiaram na gestação da Júlia e que acreditaram num parto normal, muito obrigada, esta vitória é de todos nós.
Contato: evacordeirosantos@hotmail.com
Mãe de Fernando e Júlia

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