Relato Gisele, nascimento de Catharina

Gisele, Campinas/ SP


Este relato começou no dia 04 de abril de 2010, quando estava grávida da Catharina ainda, e sofrendo pressão por todos os lados para ir para uma cesárea devido a diabete gestacional e vários outros fatores, após uma busca intensa pelo parto normal. Resolvi escrever uma carta de boas vindas à Catharina, de forma que ela pudesse sentir-se bem vinda, e deixar a casinha tão especial onde ela habitava a nove meses.. Só que esta carta começou a ficar grande, ganhar corpo e detalhes e, enquanto eu a escrevia, Catharina chegou! Foi então, que entendi que muito mais do que uma carta de boas vindas para minha filha, eu tinha o dever de compartilhar com outras mulheres a árdua busca, a persistência, e porque não dizer teimosia até os últimos segundos em resgatar o meu direito de parir. Sim, o direito que me foi tirado por duas vezes, única e somente por minha responsabilidade. Há um ditado que diz “Quando não sabemos para onde vamos, qualquer caminho serve.” E é justamente por não saber, não ter as informações necessárias, não tomar as rédeas da minha gestação e do meu parto, que acabei caindo em duas “desnecesáreas”. A primeira há12 anos atrás, quando engravidei pela primeira vez. Era tão nova e inexperiente, não sabia o que eu queria. Foi uma gestação complicada, com ameaça de aborto no 3º mês, trabalho de parto prematuro no 5º mês, seguido de cerclagem, repouso absoluto e muita inibina e dactil até o 8º mês. Acabou prevalecendo o desejo do médico, que após todo o estresse emocional que eu havia passado durante a gravidez, utilizou de um diagnostico de HPV não confirmado, mais sofrimento fetal e circular de cordão para me enviar ao centro obstétrico mesmo após eu ter passado por uma cerclagem às 20 semanas de gestação por incompetência istimocervical, o que provavelmente facilitaria e muito o trabalho de parto se a cerclagem fosse retirada. Não peguei minha filha, fui dopada, demorei tanto a ter leite que minha filha teve uma crise hipoglicemica. O alojamento não era conjunto naquela época, as enfermeiras apenas traziam o bebê quando elas queriam. Foi uma experiência angustiante.
A segunda cesárea, há dois anos e meio atrás, quando engravidei pela segunda vez. Tinha convicção de que teria um parto normal. A convicção era tanta de que parto normal é normal, ou seja, não precisa de nada – ele deve acontecer naturalmente, que não me informei, não questionei os 5 obstetras pelos quais passei, não me preparei. Talvez pela fragilidade da primeira gravidez, essa segunda foi cheia de cuidados, troquei cinco vezes de obstetra, porque ao meu ver, nenhum deles dava a devida atenção ao “estado especial” em que me encontrava. Cada dorzinha, ou suspeita de algo não estava bem, corria para o hospital, a fim de escutar o meu bebê, ou para o consultório do médico. Me sentia tão fragilizada, tão ameaçada que obviamente, acabou prevalecendo novamente a decisão maioral do médico, quando em uma consulta de rotina às 37 semanas, onde eu me queixava de que a barriga estava dura e dolorida, me mandou ao hospital no dia seguinte pela manhã para realizar alguns exames. Um dos exames detectou índice de líquido amniótico muito baixo (ILA = 2,5), o que colocaria meu filho em sofrimento fetal: “seu filho tem que nascer hoje”, foi o que ouvi. Então perguntei: “Então o senhor vai induzir o parto?” – e a resposta: “De jeito nenhum. Seu bebê não  agüenta. Não tem líquido para ele minha filha”. Meu mundo caiu, como diria Maysa. Sentei no corredor frio do hospital e desabei a chorar. Cinco enfermeiras me cercaram e me disseram que era melhor assim, pois meu bebê era muito grande! Entrei aos prantos no centro cirúrgico, passei mal a cirurgia inteira. Meu mal-estar só passou quando ouvi o choro do meu bebê. Mas não pude pegá-lo. Estava com os braços amarrados, só senti o seu cheirinho, dei um beijo e o levaram.
Pelo menos desta vez, o alojamento foi conjunto. Meu filho foi para o quarto menos de duas horas depois de ter nascido, meu leite veio mais facilmente. Consegui amamentar melhor do que da primeira vez. Mas novamente me sentia angustiada. Impotente. A única certeza que eu tinha era de que não engravidaria outra vez, pois segundo diziam, após duas cesáreas eu teria que me submeter a uma nova cesárea. Tive dores horríveis ainda no hospital, fui medicada com Traumal (logo eu, que odeio remédios). Sofri horrores com uma dor insuportável na barriga devido à manobra de Kristeller (não sei se é assim que escreve) durante a cesárea. A minha recuperação da segunda cesárea foi muito pior do que a primeira. Talvez porque eu tenha me preparado psicologicamente apenas para o parto normal, talvez porque eu não tenha aceitado a situação, eu não sei. Eu me sentia impotente e responsável por aquilo, mas não sabia o por que. Eu só sei que a única certeza que eu tinha naquele momento, era de que não teria outro filho jamais. Não tinha condições psicológicas e físicas de encarar uma nova cesárea.  Mas faltava algo. Eu sentia a necessidade de passar pela experiência do parto. Parecia um belo quebra-cabeça, com uma peça faltando, e que fazia com que toda a imagem perdesse o sentido. Era assim que eu me sentia.
O relato a seguir, faz parte do livro que estou escrevendo. O livro começou com uma carta de boas vindas para Catharina, eportanto o relato é contado PARA ela. Talvez vocês estranhem referencias ao “seu pai”, ou “seus irmãos”. Mas para não reescrever o relato, retirei do livro apenas alguns capítulos, os que retratam o trabalho de parto em si. O livro que está quase pronto, contemplatoda a minha busca pelo VBA2C, as dificuldades, as incertezas, o apoio que recebi de tantas pessoas, dos integrantes do IshitarSorocaba, das listas de discussão na internet e comunidades do Orkut, de forma que possa servir de estímulo e talvez orientação para quem já passou por uma ou mais cesáreas e assim como eu, deseja parir. Porém, é principalmente um instrumento de divulgação para mulheres que nunca engravidaram, um instrumento de alerta “Não façam a primeira cesárea”. Porque depois da primeira, tudo fica mais difícil. Quem ainda não tem filhos, opte e faça valer a sua opção pelo parto normal, de preferência natural.
Entrei em pródromos no dia 29 de março. Tenho certeza. As contrações começaram a vir regulares, durante 3 horas e depois pararam. Comecei a perder o tampão mucoso em maior quantidade no dia 02 de abril, sexta-feira santa. Tive muitas contrações durante todo o final de semana de páscoa, mas nada delas ficarem regulares. Estava tensa, precisava entrar em trabalho de parto, pois a GO já estava preocupada e desconfortável em prosseguir com a gestação devido a todos os fatores de riscos associados: Duas cesáreas anteriores, diabetes gestacional e baixa movimentação fetal que tinha acontecido na madrugada de 28 para 29 de março (posso dizer até ausência de movimentos). Parei de trabalhar devido a todos os exames que a GO pediu, estava então com 39 semanas completas. Foram dias difíceis, tensos. A pedido da GO eu ia ao hospital, a cada dois dias para fazer o cardiotoco e monitorar sua movimentação. Chegava no hospital e sempre “esquecia” o cartão de pré-Natal. Na ficha de admissão, eu sempre omitia uma cesárea (dizia que tinha um PN feito há 12 anos e uma cesárea por baixo ILA há 2,5). Sempre colocava uma semana a mais na data da ultima menstruação, e dizia que estava indo ao hospital, a pedido da GO que era de outra cidade, porque tinha ligado para ela dizendo que o bebê não estava com boa movimentação. Acabei ficando mais conhecida no hospital que o próprio porteiro. Eles achavam estranho eu sempre esquecer o cartão de pré-natal, mas eu dizia “cabeça de grávida… a gente fica muito esquecida, não é…”. Sempre me recusava a passar pelo exame de toque, dizia que não sentia nada, cólica nem contrações. Os plantonistas me olhavam torto, mas respeitavam. E quando me perguntavam para quando estava agendada a cesárea, eu dizia que queria parto normal, e eles me olhavam como uma ET. Exceto uma plantonista. A Dra Adriana. Que graça. Me apoiou, disse que eu devia mesmo tentar, e que era muito melhor para o bebê e para a mãe… Com ela eu falei a verdade sobre a diabete gestacional, mas não contei das duas cesáreas. Não era louca, já estava com quase 41 semanas quando passei com ela. Depois dos exames perguntei se ela se sentia confortável em prosseguir mais uma semana, se eu fosse paciente dela. Ela disse que pelos exames sim, mas que seria realmente necessário monitorar no máximo a cada dois dias. E reforçou é claro: Como você tem “uma” cesárea não pode receber ocitocina. Assim, reze para começar o TP espontaneamente. Mal sabia ela que na verdade eu tinha eram duas cesáreas.
Fazia em casa o mobilograma após as refeições, e isso me deixava muito mais tranqüila. Você estava bem e respondia bem aos estímulos.
A semana do dia 05 de abril passou lentamente. Fiz sessões de acupuntura diariamente com a Carla Dante, indicação da Priscila (minha parteira) aqui em Sorocaba. Durante as sessões, eu tinha contrações regulares, que depois sessavam.
Ainda no dia 08 à noite, liguei para Carla Arruda (foi a primeira pessoa com quem conversei sobre VBA2C. Ela coordena o Ishtar em Sorocaba, criamos uma relação de amizade). Perguntei se ela poderia vir em casa para fazer minha barriga de gesso na 6ª feira….Seria a despedida da barriga!
Na sexta, acordei com contrações doloridas, um pouco mais regulares. Liguei para Carla acupunturista e perguntei se ela podia vir pra casa para fazer mais uma sessão, pois sentia que algo estava diferente, parecia que iria engrenar (ou será que era minha ansiedade)? A Carla veio cedo, fez a sessão e foi embora pois tinha que trabalhar. Fiquei o dia todo com algumas contrações, mas nada do TP engrenar. Não estavam fortes, mas pelo menos não pararam igual parou na semana anterior. Fui caminhar com a Val(nossa vizinha, que apesar de morrer de medo do parto normal, e ter optado pela cesárea eletiva quando estava grávida da Júlia, comprou a causa, me apoiou o tempo todo… passava todo dia em casa me chamando para caminhar… foi muito legal!).
Logo depois do almoço,  a Carla e o Henrique (bebê lindo dela) vieram em casa para fazermos a barriga de gesso. Foi uma tarde muito agradável, a sua irmãzinha Beatriz participou, foi muito legal. Barriga moldada, combinamos da Carla pegar a barriga na 2ª ou 3ª feira para fazer o acabamento. Enquanto isso iríamos guardá-la em casa…
 A sexta-feira acabou e nada de trabalho de parto. Mas era incrível como eu estava me sentindo mais calma e tranqüila depois da conversa que eu tinha tido com a GO na 5ª feira (eu tinha dito a ela que assumiria todos os riscos mas que não faria a cesárea na 6ª feira, dia 09 como ela queria), com a Leticia, com a Carla e com o seu avô. Seu pai ao contrário, estava cada vez mais ansioso. Ele já tinha entendido que não adiantava me falar de cesárea, de riscos, disso e daquilo porque eu estava DECIDIDA. Continuou me apoiando, mas desta vez sem falar em riscos, em problemas assim como eu tinha pedido. Foi fundamental. Pedi a ele que confiasse em nós duas. E ele estava confiando… senão já teria jogado a toalha!
Sábado, dia 10, foi o primeiro dia em tantos que acordei tranqüila e confiante… eu tinha certeza que as coisas iriam acontecer. Acordei cedo, logo que fui tomar café da manhã, vi um torpedinho da Rebeca (doula de BH), perguntando se estávamos bem e se colocando a disposição para o que fosse necessário. Ela estava em SP aguardando um outro arianinho preguiçoso dar o sinal de vida, como ela mesma disse (risos). Também recebi um torpedinho da Carla acupunturista e da Lina. Depois do café fui ao Ishitarpara mais uma reunião. A Priscila faria parte daquela reunião e falaria sobre parto domiciliar. Seu pai foi trabalhar, levou seus irmãos para casa da sua avó, e a Carla Arruda (são tantas Carlas, risos) passou em casa para me pegar. Fomos juntas ao Ishitar. Subi as escadas com o Henrique (bebê da Carla) no colo, quem sabe assim ajudava a induzir? A reunião foi muito legal, pessoas novas, uma colega que também tinha tido 2 cesáreas e está grávida novamente e não sabia que era possível tentar um parto normal após duas cesáreas. Quando me apresentei, fiz questão de dizer a ela que SIM, é possível! Ela se sentiu da mesma forma que eu me senti há alguns meses atrás… enganada.. roubada. Chorou, da mesma forma que eu chorei da primeira vez que fui aoIshitar. Me senti responsável por aquela mulher…. não sei explicar, mas tenho a impressão que nossa história fará toda a diferença para ela, assim como para outras mulheres.
Terminada a reunião, a Priscila ouviu seu coraçãozinho, mediu minha pressão e atestou: Vocês estão ótimas! Fique tranqüila. A Priscila, sempre incentivando e acreditando que tudo daria certo!
A Leticia também estava lá. Conversamos bastante. O seu pai chegou, acompanhou o exame, mas ele estava tenso. Eu morria de dó do seu pai, mas não podia desistir… Eu sou teimosa mesmo, quando coloco algo na minha cabeça, é difícil tirar… É claro que não colocaria você ou eu em risco. Mas todo o monitoramento que estávamos fazendo mostrava que nós duas estávamos muito bem. Isso era o bastante para me deixar tranqüila. Já ele coitado, não sentia você dentro da barriga, então era difícil entender que estava tudo bem, após tudo o que ele tinha ouvido da GO. Fomos embora do Ishitar, morrendo de fome… Já era tarde, e precisava me alimentar e alimentar você! 
Após a reunião no Ishitar, onde encontramos várias pessoas queridas, eu me sentia incrivelmente bem disposta e com energia. Precisávamos comer e  pegar seus irmãos na casa da sua avó. Foi o que fizemos. Fomos para casa, almoçamos e fui deitar. Seu irmão,  depois de tantos dias arredio, aceitou o convite para dormir comigo depois  do almoço. Deitamos na cama da mamãe, abracei e aconcheguei seu irmãozinho, dormimos abraçadinhos… Que delícia! Deitados de conchinha, sentindo o cheirinho dele… Ele entregue aos meus braços, como há dias não fazia.
Era 14:40 quando me levantei, seu irmão dormindo gostoso e senti algo descendo pela vagina, a mesma sensação de quando estamos menstruadas. Como já estava perdendo o tampão há quase 10 dias, achei que fosse o tampão… Mas a calcinha ficou bem molhada. Mostrei para seu pai, ele perguntou “não é xixi?”. Eu disse que não, que não tinha cheiro de xixi,  e também eu não tinha “soltado”, simplesmente tinha “descido”. Liguei para a Priscila (parteira), dizendo que achava que a bolsa tinha rompido, mas que deveria ser uma ruptura alta, porque havia vazado um pouco e parado. Ela disse que se fosse uma ruptura alta que o TP poderia ainda demorar muito para começar, pois rupturas altas não fazem o efeito de uma ruptura baixa. Mas pediu para eu observar e qualquer coisa ligar para ela. Voltei a deitar, abraçadinha com seu irmão. Quando acordei, sentei na cama e senti um “ploft” no colchão. Levantei e um pouco de líquido correu pela minhas pernas. Chamei seu pai para ver. Fiquei tão eufórica que não conseguia disfarçar! Isso já devia ser umas 4 horas da tarde…. Mandei torpedo dizendo que tinha certeza que era a bolsa que  tinha rompido e que não parecia ser ruptura alta para Priscila, para a GO, para a Leticia (doula), para a Rebeca (Parto Nosso) e para a Joana… Ah! A Joana… esqueci de mencionar… Ela foi a minha inspiração… É uma pediatra de Campinas, que tinha tido 2 cesáreas e pariu lindamente em casa a Ana Luiza, acompanhada pela Priscila…
A cada esforço que eu fazia saía uma quantidade boa de líquido. Tive que colocar uma fraldinha de pano dobrada entre as pernas, para não ficar pingando pela casa… a Priscila, a Rebeca e a Leticia sempre me encorajando dizendo “que bom Gi! Agora você entra em TP…. é só uma questão de tempo!”.  Chorei de emoção… Seu pai me perguntou porque eu estava chorando e eu respondi: “Mesmo que uma cesárea seja necessária, agora ela já deu o sinal que está pronta para nascer. Meu corpo está funcionando! Estou feliz!”. Avisei minha prima Evelim que mora em SP também… o planejamento inicial era levar seus irmãos para casa dela, assim eles poderiam nos visitar e conhecer você ainda no hospital.
Coloquei até uma notinha na lista Parto Nosso (pelo Black Berry), de que a Bolsa tinha rompido. Novamente, várias mensagens positivas… A melhor coisa que eu fiz, foi ter entrado para a lista,  mesmo no finalzinho… É tão bom ver que tem pessoas que a gente nem conhece torcendo para que tudo de certo!!!
A GO pediu para eu fazer um cardiotoco e passar na maternidade de Sorocaba para ver se era a bolsa mesmo que havia rompido… Não quis ir até lá no sábado, uma porque não queria que fizessem o exame de toque (eu tinha medo que contaminasse) e outra porque  a Priscila já tinha escutado seu coração mais cedo e você estava bem. Decidi que faria no domingo caso nada acontecesse naquele Sábado…
Resolvemos sair para fazer umas comprinhas, para abastecer a dispensa, pois não havia quase nada em casa, e se realmente fossemos viajar, precisaríamos deixar a geladeira abastecida. Saí com a fralda de pano entre as pernas. A Leticia, toda hora mandava torpedo para saber como estávamos. Já começava a sentir as contrações mais doloridas, uma dor diferente, mas aindamuuuuito irregulares. Ela pediu para mantê-la informada, e a Priscila também.
Voltamos para casa, guardamos a compra e aí, a coisa começou a pegar… Lá pelas 22 horas, as contrações começaram a doer para valer, e a ter certa regularidade. Coloquei outra nota no Parto Nosso, dizendo que provavelmente que estava entrando em TP. Comecei a tomar o Caulophylum de 20 em 20 minutos conforme o livro de  homeopatia sugeria. Fui mandando torpedo para a Leticia e para a Priscila, até que a Pri me ligou e disse para eu ligar para Leticia e pedir para que ela viesse para casa. A Leticia já estava a caminho. Eu não conseguia ficar deitada. As contrações vinham a cada 15 minutos mais ou menos, mas como a dor era intensa se eu estava deitada, cada vez que vinha uma contração eu ficava paralisada, não conseguia mudar de posição, o que tornava a contração mais dolorida ainda…. Pedi ao seu pai para tentar dormir, porque se caso o TP engrenasse mesmo, ele precisaria dirigir até SP e precisaria estar bem para isto. Ele preferiu dormir na sala, e me deixou no quarto. Disse que se eu precisasse usar o banheiro o quarto seria mais confortável. Então eu fiz uma montanha de almofadas e ficava debruçada sobre ela… Quando a contração vinha, nesta posição era menos dolorida. A Priscila havia me dito para tentar descansar o máximo possível, porque iria precisar de energia quando o TP realmente estivesse na fase ativa… mas como dormir com aquelas contrações? Descobri que era possível dormir entre as contrações, então a cada 15 minutos eu acordava com a dor, rebolava, ou agachava, e quando a dor passava eu voltava a dormir. A Letícia chegou por volta de 01 da manhã.
A Leticia foi A doula. Ela fez chá de framboesa que a minha amiga Raquel trouxe dos EUA para mim, com canela e gengibre. Preparou o escalda pés, fez massagem. Cada vez que eu acordava com contração, com dor, ela fazia massagem na minha lombar. Me incentivava a agachar, acocorar e chamar por você. “Venha Catharina….”.  Me deu o Caulophylum de 15 em 15 minutos (a cada contração) a noite inteira. Hora ou outra chegava um torpedo da Priscila pedindo notícias, como estava progredindo. Mandei a Priscila ir dormir umas 3 vezes por torpedo, mas ela não conseguiu. Aliás, só consigo lembrar dos detalhes por causa dos torpedos. Às 02 da manhã, a Priscila encanou que “precisava ouvir a Catharina”… eu nem me toquei, mas ela estava contando as horas de bolsa rota…Sei que ela apareceu em casa devia ser umas 04 ou 05 da manhã… Adivinhem? As contrações pararam claro… Como eu estava sensível às mudanças! A Leticia chegou, as contrações desregularam. A Pri chegou, as contrações pararam. A Pri foi embora, o bicho pegou novamente. Amanheceu, tomamos café da manhã e a Leticia foi caminhar comigo. Caminhamos, mas eu estava bem cansada pela noite mal dormida… Logo perto da hora do almoço, deixamos seus irmãos na casa da vovó e fomos ao hospital fazer o cardiotoco que a GO pediu. Durante o exame tive 2 contrações beeeeeem doloridas. Mas como estavam muito irregulares, a Leticia foi para casa dela. Disse que a chamaria caso apertassem de novo.  Fomos para casa, almoçamos e resolvemos deixar seus irmãos na casa da sua avó. Assim ficaria mais a vontade para gritar se fosse preciso, ficar pelada. Ficaríamos mais tranqüilos e seu pai poderia descansar também. Lá pelas 2 horas da tarde, com quase 24 horas de bolsa rota, as contrações começaram a pegar mesmo. Como doíam! Mas ainda estavam bem irregulares. Tomei banho quente, rebolei na bola que a Leticia tinha deixado… Arranquei toda a roupa… A Leticia enviou um torpedo, perguntando como eu estava e eu disse que as contrações estavam apertando. Comecei a sentir frio…  Seu pai mediu minha temperatura e ficou preocupado, pois estava com 37,7 – justo eu, que NUNCA tive febre na vida – nem com pneumonia, nem com apêndice infeccionado, com nada! Ele resolveu ligar para a Priscila, que pediu para avisarmos a GO… Mas eu não quis preocupa-la. Seria mais um fator de risco. Ela sabia da bolsa rota desde sábado, eu havia mandado torpedo falando do cardiotoco e silêncio total… nenhum torpedo nenhuma ligação pois ela estava num curso o dia todo. Por volta de 16:30 a Priscila conseguiu falar com ela… e me ligou. Meu mundo caiu. Seu pai queria ir para o São Luiz. A Priscila queria ir para o São Luiz. A GO não queria. Disse com todas as letras que se eu chegasse no São Luiz fora de TP ativo, que ela me faria uma cesárea sem hesitar. Disse que ela era visada no São Luiz, que não podia internar uma paciente com duas cesáreas anteriores, diabete gestacional, 40 semanas e 5 dias, e quase 30 horas de bolsa rota! Ela me ligou no intervalo do curso, e repetiu a mesma coisa que disse para a Priscila para mim. Disse que eu sabia desde o começo que se o trabalho de parto não fluísse naturalmente, que eu sabia que seria cesárea… Eu tentava dizer para ela que estava fluindo e ela não me ouvia… Comecei a ficar nervosa, acho que comecei até a gritar… No meio da discussão tive uma contração muito forte, passei o telefone para o seu pai… Ela repetiu tudo que tinha me dito para o seu pai. Seu pai tentando negociar. Sugeriu para ela que fossemos para o São Luiz, e que se nada acontecesse até as 07 da manha ela podia fazer acesárea. Quando a contração passou, ele voltou o telefone para mim… Ela começou a repetir as mesmas coisas, eu disse que ela tinha aceitado o caso, que ela não podia me deixar à deriva assim… Aí veio o mais absurdo. Ela me disse para internar no hospital de Sorocaba e que quando o trabalho de parto realmente estivesse ativo, para pedir alta pedido e ir para SP. Eu disse que ela estava louca, que eu não ia internar em Sorocaba. Que ELA era minha medica, e que eu ia internar no nome dela em SP. O seu pai disse que eu gritei com ela “quer dizer que estou sem médica então?”… eu não me lembro disso… sei que disse para ela que iria desligar e que depois falava com ela… Isso devia ser umas  5 ou 6 da tarde… Chorei de raiva, de ódio de indignação! Não tinha chegado até ali, para ouvir que iria ser submetida a uma cesárea! Embora todo mundo diga que para ter contrações tem que estar “zen”, para liberar ocitocina, comigo foi exatamente o contrário. Eu estava com tanta raiva da situação que acho que foi a raiva que desencadeou as contrações… Vieram muito doloridas… Fui caminhar com a Leticia, nessa altura as contrações estavam muito fortes, a Priscila já estava em casa, tinha me examinado. O colo estava anterior e bem mais molinho, o que significava que as contrações estavam trabalhando o colo. Nada de dilatação ainda, mas bem mais trabalhado. Cada contração que vinha eu agachava…. Estava difícil não gemer e não fazer barulho, porque as contrações estavam realmente doendo. Seu pai resolveu ir buscar seus irmãos e sua avó para ficarem em casa. A Leticia me ajudou a terminar de arrumar as coisas para levar ao hospital. Não sei em que momento, a GO ligou para a Priscila novamente, não sei nem para que… Sei que ela me ouviu urrando de dor, e falou para a Pri que éramos para ir para São Paulo… Nem acreditei… Continuamos andando, tomando chá, tomando as homeopatias… E seu pai não chegava nunca… foi uma eternidade… até a Letícia falou: “Tá com pressa de ir pro hospital? Quanto mais tempo ficarmos aqui é melhor!” Mas eu tinha medo era de não conseguir ficar sentada no carro se as contrações piorassem…. E elas estavam piorando.
Seus irmãos e sua avó chegaram. Que felicidade ver seus irmãos! Foi uma alegria tão grande revê-los depois de tantas horas! O Arthur quis colo, estava carinhoso novamente… A Bia estava com o rostinho preocupado… Expliquei para ela que eles não iriam, porque eu precisava do banco de trás e precisava que a Leticia fosse comigo. Disse que se desse alguém iria buscá-los em Sorocaba para nos visitar. Ela entendeu, ou pelo menos fez que sim… É uma mocinha, e compreendeu que aquele momento não era para discutir. Chorou quando nos despedimos… Fiquei morrendo de dó. Acho que ela chorou por não poder participar, não poder ir junto.
Saímos de Sorocaba por volta de 21 horas do domingo, dia 11. Ao sairmos as contrações deram uma espaçada,  mas ainda vinham muuuuito fortes. Eram, realmente, diferentes de tudo o que eu tinha sentido nas duas ultimas semanas. Tinha certeza que o TP havia começado. Era só uma questão de tempo para receber você em meus braços. Em uma hora de viagem, acho que tive mais ou menos umas 05 contrações fortes. Chegamos em SP, e seu pai e a Letícia estavam com muita fome. Eu na verdade também,  porque tínhamos apenas almoçado e mais nada além de chá. Seu pai quis parar no Mcdonalds (para meu desespero e da Letícia!), mas como a Priscila já tinha liberado para comer (ela tinha certeza que era trabalho de parto), fomos lá, encarar o tal do Mc gordura. Pedi um lanche de frango grelhado, de forma que minha consciência pesasse menos… mas estava difícil comer com dor.
Terminamos de comer e seguimos direto para a maternidade São Luiz. Chegamos lá, o carro uma zona, paramos na frente da maternidade e fomos recebidos pelo porteiro todo engravatado, com rádio. Aquele hospital é o mundo de caras. Não existe nada parecido aqui em Sorocaba. Pegamos um carrinho (igual aos de aeroporto) e colocamos todas as malas. Foi quando tive uma contração daquelas. O segurança ficou olhando para mim espantado. Perguntou se eu queria uma cadeira de rodas, e eu é claro, disse que não! Tudo o que eu NÃO queria era ficar sentada! Sentada e deitada a dor era muito pior!
A Leticia me acompanhou até a recepção do hospital, enquanto seu pai foi levar o carro até o estacionamento. Enquanto esperava a recepcionista desligar o telefone, enviei torpedo para a Priscila e para a GO informando que já havíamos chegado. A GO respondeu, dizendo para abrirmos uma ficha que a enfermeira ligaria para ela. Isso era um pouco mais de 22 hs. Assim que terminamos a admissão, a enfermeira nos encaminhou para uma sala para fazer o exame admissional.
Mandou que eu tirasse a roupa, e colocou um cardiotoco. Eu disse que não queria o exame de toque, que esperaria pela médica para fazer. Ela ligou para a GO, que pediu que fizessem o toque. Já não gostei do procedimento aí, mas não estava afim de ficar brigando. Durante o cardiotoco tive duas contrações bem fortes e outras mais fracas, irregulares. A Priscila e o seu pai também chegaram e acompanharam o exame. Após terminar o cardiotoco, a enfermeira fez o toque, constatou 3 cm de dilatação, colo médio e anterior. Já tinha melhorado – em casa estava com 1 cm de dilatação, colo grosso e anterior. Sinal que as contrações estavam surtindo efeito sobre o colo. Nesta altura eu já estava perdendo bastante líquido bastante tampão e um pouco de sangue.
Priscila e Leticia saíram da sala e o seu pai ficou comigo para respondermos o questionário. Resolvi omitir algumas informações de forma que a GO se sentisse menos desconfortável com a situação. Omiti as 30 horas de bolsa rota, omiti 1 cesárea e omiti a diabete gestacional. A única que tinha que saber de tudo isso era GO, que seria a responsável pela minha internação e pronto. Essas informações não iam ajudar em nada se eu colocasse na ficha de admissão do hospital.
Saímos da sala de exames e ficamos na recepção luxuosa do São Luiz esperando pela sala de Delivery (sala de parto natural). A cada contração eu agachava na recepção e rebolava. Acho que o pessoal que estava lá deve ter achado que eu havia fugido do hospício… Mas eu não estava nem aí… Estava feliz por estar entrando em TP, embora ainda irregular.
A Leticia então sugeriu que fossemos caminhar, e a Priscila mostrou onde havia uma mega escada. Fomos até a escadaria, e subimos até o quinto andar, de 2 em 2 degraus. A cada 5 minutos vinha uma contração pior que a outra e eu agachava em cada uma das contrações e rebolava. Segurava no corrimão da escada e agachava até a contração parar. A Letícia fazia massagem na minha lombar até melhorar a dor da contração. Descemos os 5 andares novamente, fui ao banheiro um pouco de sangue vivo apareceu no absorvente. Bebi um pouco d’água, prendi o cabelo e descansei uns 10 minutos antes de começar a peregrinar pelas escadarias do São Luiz novamente. Repetimos esse processo mais duas vezes, sob os olhares curiosos e porque não dizer, contestadores da ascensorista e do segurança. Comecei a ficar impaciente, com vontade de arrancar a roupa, e a gente ali na recepção do São Luiz. Demorou demais para liberarem a sala do Delivery, quando finalmente veio a noticia, comemoramos. Junto com a liberação da sala, chegou a Eneida. A Eneida é uma acupunturista maravilhosa que trabalha com os médicos humanizadosem SP. Acho que a GO havia ligado para ela ir para lá.
Claro que eu e a Letícia fomos para a LDR (labor delivery room) de escadas. Entramos na LDR por volta de meia noite. A Eneida começou a “medir” a energia do lugar e usar umas sementes de Aguaí para equilibrar pontos desfavoráveis… Acho que foi isso… a partir daqui não tenho muita certeza da ordem cronológica dos acontecimentos e para ser sincera, nem dos acontecimentos. Fiquei “bem” impressionada com a sala. Tinha lido diversos relatos de mulheres que ao chegar no hospital acabam travando. Comigo foi exatamente o oposto. Estava em um ambiente que eu não conhecia ninguém, que podia gritar, fazer o que quisesse que ninguém viria bater na minha porta para perguntar o que estava acontecendo. Pela primeira vez, agradeci ao seu pai por não ter apoiado o parto domiciliar. O condomínio onde moramos é muito legal, mas é pequeno e todo mundo acaba se metendo onde não deve. Lá no hospital, me senti mais a vontade.
Uma enfermeira veio nos receber, colocou uma pulseira amarela no meu pulso (até agora não sei pra que serve) e logo tratou de me colocar no cardiotoco. Lembro que pedi para a Leticia fazer o chá de framboesa da Raquel, e para isso precisávamos de água quente. A Priscila pediu e logo veio uma bandeja com água mineral e duas garrafas de água quente para fazer o chá.
O cardiotoco deu tudo OK, então a Eneida começou a fazer a aplicação das agulhas. Não sei onde estavam todos, sei que fiquei por uma hora na sala só com a Eneida. Ela trabalhou todas as cicatrizes. Disse que era importante restabelecer o fluxo de energia que normalmente com uma cicatriz fica prejudicado. Impressionante que as contrações começaram a vir ritmadas de 5 em 5 minutos… e como eram fortes… Era mais ou menos 1 da manhã. Eu estava deitada recebendo a acupuntura, e era muito difícil ficar deitada. Ela também ministrou alguns florais… Até que as pessoas começaram a surgir… Leticia e Priscila chegaram paramentadas, trouxeram chá, biscoito e maçã eu acho. Mas eu não conseguia comer nada… só bebia muita água. A Eneida tirou as agulhas, devia ser umas 2 horas da manhã… acho que as contrações estavam acontecendo  a cada 4 minutos, não tenhocerteza, mas eu lembro que a dor era imensa. Eu não conseguia ficar parada. Cada vez que vinha uma contração eu rebolava, dançava… estava muito frio naquela madrugada. Lembro que a Leticia ligou o aquecedor perto da mesa de exame do bebê recém-nascido. Eu me apoiava na prancha da mesa e rebolava. Não sei como aquela prancha não quebrou.
Eu sempre ouvia a Priscila no telefone com a GO. Sempre contando para ela o que estava acontecendo. Numa dessas vezes, a GO falou que o hospital ligava uma câmera que tinha na LDR para caso a paciente quisesse que a família acompanhasse o trabalho de parto. Eu só ouvia a Priscila e o seu pai indignados com a informação… Eu não estava nem ligando. Estava tão absorvida com tudo aquilo que não me importei. Depois fiquei sabendo que por via das dúvidas, seu pai colocou um pano na frente da câmera… Hilário, até agora não sei se filmaram ou não. Seu pai jura que filmaram, uma vez que segundo ele, como eu parecia uma leoa  rugindo, claro que alguém iria querer ver o que estava acontecendo!
Eu não me lembro de muitas coisas, estava na Partolândia… Mas como a Leticia tirou algumas fotos e fez alguns vídeos, assistindo vem alguns flashs na minha mente. Eu lembro que a cada contração, seu pai ou a Letícia massageavam minha lombar. E eu agradecia por meu corpo por estar funcionando e respondendo.
Eu chorava e ria ao mesmo tempo. A Priscila me perguntou por que eu estava chorando, se era de dor… e eu disse “é de felicidadePri!
Eu estou tendo as contrações”… dizia isso e chorava, ria e agradecia (olha a foto ao lado! Rindo!!)
Eu sei que me sugeriram o chuveiro e a banheira e eu não quis… tive medo do trabalho de parto parar por causa da água… mas acho que eu devia estar com muita dor, pois insistiram demais para eu ir para o chuveiro. Lembro que fui, tentei ficar na bola embaixo do chuveiro. Sei que o seu pai acabou me tirando de lá e começaram a falar que eu estava me queimando de tão quente que estava a água… Briguei com a Priscila e com o seu Pai, porque eu estava com dor, e eles ficavam me atormentando, dizendo que eu estava com as costas vermelha e queimada por causa da água muito quente.
Lembro que saí do chuveiro quente, e parece que as contrações ficaram piores, mais fortes. Eu fui pra bola suíça e cada vez que vinha uma contração eu rebolava, freneticamente sobre a bola, até a contração passar…
Não sei em que momento, a tal pulseira amarela começou a me irritar… me sentia presa, aquela pulseira me apertando… foi uma sensação horrível. Pedi desesperadamente para tirarem aquilo do meu pulso. Alguém arrumou uma tesoura e cortou a pulseira… ufa, que alívio… pareciam que estavam tirando uma algema de mim… É impressionante, como detalhes tão pequenos como esta pulseira, interferem no momento do parto. O mesmo aconteceu com a camisola… Quando cheguei na LDR, a enfermeira veio com uma sacola do hospital, com duas camisolas dentro. Tentaram me fazer vestir a roupa do hospital, mas fiquei menos de 5 minutos com ela e já arranquei… que tecido estranho, áspero.
Com relação à roupa, bom esse é um caso a parte. Como estava frio, foi um tal de tirar e colocar roupa… uma hora me dava calor eu arrancava toda a roupa… outra hora me dava frio e eu colocava meu hobbie de malha velhinho. Teve um momento que a Leticia colocou até uma blusa de lã sobre mim (sei por que vi o vídeo).
Lembro da Leticia fazendo massagem, pedindo para eu relaxar… mas era difícil relaxar… cada contração que vinha, parece que meu corpo inteiro contraía junto… tem algumas coisas que não dá para controlar…. Lembro que quando eu estava sobre a bola, cansada, exausta, o seu pai sentou na poltrona atrás de mim.  Quando a contração passava eu  me jogava para trás no colo dele ainda sobre a bola… cochilava durante uns dois minutos e depois vinha uma nova contração. Acho que ficamos assim, tentando descansar por uma hora.
 A dor estava cada vez mais forte, e a Priscila sugeriu a banheira novamente. Eu não sei exatamente em que momento, mas eu sentia vontade de ir ao banheiro e não saía nada… a Pri dizia que era você, descendo e fazendo pressão… mas eu tinha certeza que era vontade de evacuar.
De repente me deu uma vontade louca de vomitar. Vomitei muita água, acho que toda a água que eu tinha bebido até ali.
Seu pai me ajudou a entrar na banheira, como foi difícil entrar… eu já estava com dificuldades de fazer certos movimentos pelo cansaço. A banheira era alta, e não tinha onde me apoiar para entrar.
Estava num estado que parecia de transe. Eu me deixava levar, tinha noção do que estava acontecendo, mas não conseguia ter ação sobre nada. Lembro que entrei na banheira e fiquei por lá durante umas 4 contrações… parece que as contrações deram uma espaçada, não sei quanto tempo durou a imersão na água quentinha. Santa banheira… consegui relaxar por um tempo. Depois não conseguia mais ficar, a dor era muito forte eu precisava me mexer, era como se eu me mexendo a dor fosse embora mais rápido.
Quando saí da banheira, a Priscila e a Leticia me fizeram agachar em cada contração…. eu estava exausta, parecia impossível ficar agachando. Mas eu agachava, eu sabia que isso te traria mais rápido para meus braços. Eu agachava e rebolava agachava, pulava agachada, é até estranho assistir aos vídeos… com certeza eu estava na Partolândia em transe…
E a música que estava tocando no aparelho de CD colaborava totalmente para um transe… Parecia uma música indiana, música de ritual ou algo assim. Colocaram também uma essência não sei se era de calêndula, mas deixou um cheiro muito bom, um cheiro de natureza na sala… Tiveram alguns momentos que chamei pela sua avó Sueli…. Pedi que ela me ajudasse, que medesse forças. Agradeci novamente por tudo o que meu corpo estava passando. É algo tão intenso, que fica impossível descrever. Só quem já passou pode entender.
Nos momentos em que a dor era tão forte, a Pri dizia: “Gi,’ uma a menos! Coragem!”… e eu pensava “cheguei até aqui, nada me fará desisitr!”. Eu consegui…. falta tão pouco agora! Vem Catharina, vem filha…. ajuda a mamãe…. falta muito pouco”,  era só isso o que eu pensava, e acho que dizia também.
Sei que teve um momento que a Pri quis me examinar. Acho que a GO pediu, pois ela quis porque quis ver a dilatação. A todo o momento ela ouvia o seu coraçãozinho e tranqüilizava seu pai. Acho que devia ser umas 05 da manhã e veio a melhor noticia da madrugada inteira: 08 cm de dilatação. Quando a Pri disse: 08 cm!, parece que o mundo parou…. quase não acreditei! Faltava tão pouco!!! Aquilo me deu um gás novo. Cada vez que a Pri ouvia o coração, a posição que ela colocava o sonar estava mais e mais baixa… Você estava descendo… e cada minuto que passava era um minuto a menos para te receber em meus braços… entre uma contração e outra, que já estavam quase emendadas, eu tentava descansar, respirar e relaxar.
Sei que fui novamente ao chuveiro. Pedi para seu pai entrar comigo. Não sei exatamente que horas foi isso, mas ele entrou no chuveiro comigo, fez massagem na lombar a cada contração.
Quando saí do chuveiro, fui direto para a bola… estava tão cansada que não conseguia mais agachar a cada contração… também, acho que nessa altura nem precisava mais… acho que você já tinha descido tudo.  Sentei nua, no banquinho de parto que estava posicionado em frente à cama, onde antes estava a bola, e debrucei sobre a cama, tentando descansar…
Era pouco mais de 6 horas da manhã quando a GO chegou. Pintou um clima meio estranho de início, mas ela foi super carinhosa e atenciosa e quebrou esse clima. Eu lembro dela dizendo para eu relaxar durante as contrações, fez carinho em mim. Acho que nessa hora foi a hora em que as contrações estavam praticamente grudadas uma na outra. Muita dor. O problema foi que ela quis fazer um novo cardiotoco para ver como você estava, e era I-M-P-O-S-S-I-V-E-L ficar com aquele troço apertando a barriga… era tão difícil, que o aparelho não conseguia manter o foco para registrar os seus batimentos cardíacos. Mesmo assim eu deixei. Deixei porque tudo que fosse importante para garantir o seu bem estar, eu estava encarando.
Acho que foi por volta de umas 6:20 ou 6:30, a GO sugeriu que eu sentasse na banqueta de parto para que ela pudesse me examinar, para ver com quanto de dilatação eu estava.
Eu estava sentindo os primeiros puxos, não conseguia mais ficar sobre a bola… a cada contração eu tinha que levantar da bola e apoiava no joelho do seu pai, que permanecia sentado atrás de mim me dando o apoio, massageando, dizendo palavras para me fortalecer. Ele o tempo todo me lembrava que era isso o que eu queria, e que agora faltava muito pouco para termos você em nossos braços.
Então, a Priscila e a Leticia posicionaram a banqueta de parto e uma escadinha atrás dela para seu pai ficar e eu recostar nele. Sentia uma vontade imensa de evacuar, e a GO e a Priscila diziam que era você quem estava fazendo pressão e por isso eu sentia aquela vontade. Mas na verdade, eu realmente precisava evacuar. E elas disseram para eu fazer o que eu precisasse fazer, pois a força para evacuar ajudaria você a descer.
Quando a GO fez o toque, disse que já estava sentindo sua cabecinha. Eu mal acreditei! Mas eu podia sentir o toque muito raso, quase fora da vagina! Perguntei para elas se era verdade, se elas não estavam dizendo isso apenas para me animar. A GO disse: “Coloque a mão. Você vai sentir o cabelinho dela!”. A emoção de colocar a mão e sentir sua cabecinha, acariciar seu cabelinho eu não consigo descrever. Foi seu primeiro “cafuné”. Foi a maior emoção que eu senti. Eu já estava no final do expulsivo! Então a Priscila disse para a GO “A Gisele disse o trabalho de parto inteiro que queria que eu aparasse a bebê!”. A GO saiu, a Priscila assumiu a posição, sentou na minha frente com as pernas cruzadas. Colocou o espelho na frente dela, colocou meus pés sobre os joelhos dela, mandou que eu segurasse na banqueta de parto e que fizesse força para baixo, quando a contração viesse. Seu pai, atrás de mim, com os braços passando por  baixo das minhas axilas, me suportando e apoiando o tempo todo! Só que eu não sei porque, acho que era o êxtase do momento, mas eu já não sentia mais as contrações… não sentia mais dores. Tive que me concentrar, e quando veio algo parecido com uma contração, enchi o peito de ar e empurrei. Empurrei para baixo, com toda a força que eu tinha… mas eu estava muito cansada! A Pri e a GO me incentivaram: “Isso Gi, está fazendo certinho. Continua, coragem!” – Mais uma contração e consegui ver sua cabecinha coroando pelo espelho. Então a Pri disse para eu segurar, ir devagar. “RespiraGi, não faça a força agora. Respira”. Senti o circulo de fogo, que tinha lido em tantos relatos. É uma sensação muito diferente de tudo! Queima, arde e ao mesmo tempo era tão gostoso sentir que você estava chegando!  Foi muito rápido… veio outra contração, a Priscila dizendo para eu empurrar, fazer força junto com a contração…. uma força bem longa, o mais longa que eu conseguisse…. e eu consegui. Segurei nas mãos do seu pai (isso eu sei por que tem o vídeo), e fiz toda a força do mundo. Urrei para tentar não fazer a força na garganta, para soltar a musculatura e direcionar a força para o períneo. Fiz uma força longa e sua cabeça saiu. Senti sua cabecinha saindo, depois senti um ombro e depois o outro…. e você escorregou inteira para as mãos daPri.
Só vi quando você escorregou porque, durante a força, eu fechei os olhos e me concentrei em fazer a melhor força que eu podia. Vi você toda gordinha, redondinha, nos braços da Pri e te peguei. Peguei você com aquele cheirinho gostoso de parto, um cheiro que eu já estava sentindo há dois dias… tão macia, tão gostosa… Tão grande e ao mesmo tempo tão pequena… A Pri exclamou “Nossa que meninona! Deve pesar uns 4 kg!!!”

Seu pai, não disse nada. Apenas chorou. A Leticia me deu uns panos para te aquecer, e eu fiquei ali, sentada, exausta, feliz, te segurando e olhando nos seus olhinhos… e você olhava nos meus olhos… Foi um momento só nosso, parecia que ninguém mais além de nós 3 estava ali. Parece que o ambiente ficou sem som, estávamos numa bolha, eu, você e seu pai. Você nem chorou. Ficou ali, calminha. Coloquei você no peito, mas você só deu uns beijinhos, umas lambidinhas… Ficou ali, sentindo o cheirinho da mamãe.
Quando o cordão parou de pulsar, a Pri falou: “olha Gi, pega o cordão. Já parou de pulsar, viu?” – então pegou a tesoura, entregou para o seu pai, e explicou para ele como ele tinha que fazer para cortar o cordão. Seu pai cortou o cordão todo orgulhoso e feliz! (infelizmente só temos o vídeo, não temos fotos).
Quando me dei conta, haviam duas pediatras na sala… acho que já deviam estar lá mas eu não as tinha visto. Estavam esperando pacientemente eu te entregar para elas realizarem os procedimentos. A pediatra que a GO tinha chamado, estava presa no congestionamento de São Paulo, então chamaram as pediatras de plantão mesmo. Eu disse que não queria nenhuma intervenção em você, que não queria Vitamina K injetável, que não queria colírio de nitrato de prata. Elas respeitaram, apenas ouviram seu coraçãozinho e te pesaram.
Lembro de ter perguntado seu Apgar, e uma delas respondeu: “Eu não sei. Mas quando cheguei me disseram que foi 09 e 10”. Acho que ela  não gostou muito de ter sido chamada depois que você tinha nascido. Seu pai acompanhou todo o exame que fizeram em você. Você pesou nada menos do que 3,900 kg! Uma meninona!  Depois que te examinaram você ficou aconchegadae quentinha no colinho do papai enquanto a Priscila e a GO cuidavam da mamãe.
Enquanto você estava sendo cuidada, a Priscila me transferiu para a cama, para ver se havia alguma laceração no períneo.
Fui para a cama, colocaram aqueles apoios de pernas e fiquei lá, na posição mais gostosa do mundo (risos).
A Priscila ainda falou: Que beleza esse suporte! Suturar períneo em parto domiciliar ninguém merece!
Então disse que eu tive umas laceraçõezinhas bem pequenas, que meu períneo era ótimo e que ela só ia suturar por causa da forma que lacerou, não pelo tamanho da laceração. Assim pelo menos não iria arder para fazer xixi (essa Priscila! Risos)
Você veio novamente para meu colo, e ficamos ali namorando…
Primeiro esperaram a expulsão da placenta, e verificaram que a placenta estava inteirinha.
Pedi para guardar a placenta e a enfermeira que estava na sala disse que ia pegar o saquinho de placenta. Eu achei que era a única maluca que pedia para levar a placenta embora, mas ela disse que não, e que justamente por isso, existiam as tais embalagens. A placenta está congelada, pois vamos plantar uma árvore em um lugar bem bacana, e enterrar a placenta no pé da árvore. Ela que nutriu você por nove meses, agora servirá de adubo para uma árvore. Queremos fazer isso com a presença dos amigos queridos e das pessoas que acompanharam toda essa história!
Tive uma sensação muito ruim logo depois que a Pri terminou de suturar a laceração do períneo… Deve ter sido apenas o cansaço, mas eu tinha a nítida impressão que ia desmaiar. Conseguia ouvir tudo o que falavam, mas não conseguia nem falar nem abrir os olhos. Minha pressão estava baixa, talvez pelo cansaço, falta de alimentação e pelo sangue que perdi. Mas a GO logo colocou um soro com alguma coisa e eu melhorei. Assim que melhorei já quis sentar, e pegar você para amamentá-la. Você também precisava repor as energias!!! Nós duas (aliás, todos ali) estávamos exaustas. Você mamou como quem já sabia mamar… mamou com gosto… e eu tinha bastante colostro para te dar.
Chegou o meu café da manhã hiper reforçado. Que delícia poder comer muuuuuuito depois de toda aquela energia gasta! Então, depois que você acabou de mamar, eu tomei um super café da manhã, a Pri e a Leticia também foram tomar o café delas e o seu pai ficou ali comigo. Acho que ele só foi comer depois.
Devia ser quase 10 horas, quando a Neo Ana Paula Caldas chegou. Ela disse que tinha saído de um parto era de madrugada, e ficou esperando a GO ligar. Quando a GO ligou, ela saiu,  mas teve a falta de sorte de pegar um super congestionamento na Bandeirantes.
Chegou, deu uma olhadinha em você, nos tranqüilizou, disse que você não tinha nenhuma característica de bebê de mãe com diabete gestacional (exceto o peso, mas como seus irmãos também nasceram grandes, essa hipótese estava descartada). Seucapurro foi de 39 + 2. Então, carinhosamente, ela colocou uma roupinha em você, de forma a evitar os procedimentos do berçário central. Ah.. o berçário central do São Luiz… É tudo lindo, perfeito, mas eu não queria que te levassem para lá…. Infelizmente nem todas as regras e protocolos são possíveis de serem quebrados… e esse, acho que foi o único que eu não consegui burlar.
Então, depois que a Ana Paula te examinou e te trocou, prescreveu alojamento conjunto, nada de intervenções no berçário central, e retorno à mãe o quanto antes para amamentação. Retirou a prescrição da pediatra de plantão para fazer o acompanhamento da glicemia (procedimento de rotina da maternidade, para bebês que nascem acima de 3,700), graças a Deus! Imagina, ficarem te furando de hora em hora?
Fomos para o quarto, para almoçar e aguardar sua chegada. Passei o dia bastante cansada, mal conseguia dar 3 passos, que ficava muuuuito cansada. Achei que fosse pelas 2 noites sem dormir e por toda energia desprendida no trabalho de parto. Mas fiquei sabendo depois que estava com anemia, e por isso o cansaço.
Coloquei uma nota na lista Parto Nosso (via celular), dizendo que você tinha nascido de parto natural, e que estávamos bem. Disse que a Priscila e a Leticia me acompanharam o tempo todo e que a GO chegou apenas para o expulsivo. Para que eu fui fazer isso? A GO me ligou no inicio da noite, dizendo que estava magoadíssima com aquela nota, pois tudo que ela fez ou falou foi por preocupação. Que desde o inicio ela torceu muito para que eu tivesse o parto do jeito que eu queria. E pediu desculpas se ela não tinha acompanhado o trabalho de parto, mas que ela estava descansando para poder acompanhar o trabalho de parto durante o dia. Enfim, desligou dizendo que estava transferindo meu caso para o plantonista do hospital, e que dali para frente eu seria acompanhada por ele. Que a minha alta também seria dada pelo plantonista, e que eu não precisaria pagar nada para ela. Eu não ia colocar nada disso aqui, mas choquei. Hoje passados dez dias de tudo isso, entendo a posição dela, embora ainda não concorde com a conduta. Principalmente porque eu estou com uma anemia considerável que precisa de acompanhamento. Porque hoje sei que embora as coisas não tenham saído da forma como eu gostaria, ela foi a GO quem eu escolhi para me acompanhar, e sei também que devido a todos os fatores de riscos associados, talvez nenhum outro GO tivesse esperado tanto para que eu entrasse em trabalho de parto. Meu desejo sincero, é que um dia possamos aparar as arestas que ficaram, pois tenho certeza que assim como eu, ela também aprendeu muito com toda essa história.
E aqui, Catharina, começa a sua história fora da barriga. Uma história linda que vamos escrever juntas. Talvez seja o fim da “História da Barriga”, mas é a história que temos obrigação de divulgar para o mundo. Divulgar que nós mulheres podemos parir, independente do que nos digam. Basta querermos. Precisamos divulgar para o mundo que existem profissionais humanizados, comprometidos com a causa da humanização do parto e do nascimento.  Que existem milhões de possibilidades além daquelas que nos são apresentadas, às vezes por medo, por excesso de cuidado. Muitas vezes por comodismo ou apenas por ignorar os fatos e dados mais recentes.
Aqui começa uma nova história. A história da mamãe Gisele, mamífera, mulher, nova mãe. Nova porque vivenciou no seu parto, o parto roubado dos seus irmãos. Nova mulher, porque hoje entende a magnitude de seu próprio corpo. E nova mamífera, porque só o parto natural despertou em mim esse poder maravilhoso de ser mamífera, fêmea.
Hoje, eu sou Mulher, Mãe, Mamífera
Busquei e gestei o sonho de parir
Gestei e consegui parir
Mesmo contra todas as indicações, mesmo contra todos os protocolos que quebrei…
Pari  em mim segurança, confiança e força
Pari e renasci uma nova mulher
Pari Catharina, que de casta e pura além do nome, traz a pureza da confiança que tenho na natureza feminina, no meu corpo, tão perfeitamente projetado por Deus para fazer o corpo feminino, a mulher trazer vida à Terra.


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